1. Questão Prévia
Partindo de uma discussão que tinha em vista a troca de impressões à volta do Seguro de Responsabilidade Civil Automóvel, interessoume encontrar de forma precisa e elucidada a resposta à questão de partida que ostenta o título deste pequeno texto:
Até que ponto o seguro de Responsabilidade Civil Automóvel exclui, em caso de sinistro, os danos sofridos por passageiro transportado gratuitamente?
Cabendo-me a responsabilidade para tecer algumas considerações a volta do assunto tendente ao esclarecimento, começo por, antecipadamente, trazer à memória os seguintes conceitos:
2. Enquadramento
O seguro de Responsabilidade Civil Automóvel está intrinsecamente relacionado com o instituto jurídico de responsabilidade civil geral, implicando na sua base uma distinção de responsabilidade contratual, aquela que sucede sempre que preexista uma relação jurídica obrigacional, neste caso a existência de um contrato de seguro que vincula a seguradora e o tomador de seguro; e responsabilidade extracontratual, que se traduz sempre que não exista uma relação jurídica prévia e a ocorrência do dano na esfera daquele que à partida será constituído credor resulte da violação de um dever genérico, fundamentalmente, da violação do dever de respeito por situações jurídicas alheias.
É nestes termos, que se evidencia a figura do terceiro lesado (o passageiro transportado gratuitamente), que é a vítima de um acidente de viação e, mesmo não sendo parte do contrato de seguro, é detentor do direito de indemnização, considerando que o de assumir responsabilidades e de a elas se obrigar é uma característica da condição humana.
Aliás, também recomenda o princípio geral de Responsabilidade Civil, previsto nº 1 do art. 483º do Código Civil, que:
Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação
Assim, por exemplo, um passageiro que se faz transportar num veículo automóvel, em caso de um sinistro e manifesta culpa do condutor, àquele assiste o direito de indemnização sobre o último, pelos danos causados.
Contudo, as Condições Gerais do Seguro Automóvel, são, em relação a Lei Geral, o Código Civil, uma Lei Especial e prevalece com intuito de delimitar as garantias dentro de negócio jurídico que é o seguro Automóvel.
Esta delimitação das garantias, face à Lei geral é evidente em algumas Condições Gerais da Apólice, ao excluir, entre outros, os danos sofridos pelos passageiros transportados gratuitamente e, em contrapartida, o tomador de seguro tem a faculdade de contratar adicionalmente a cobertura de ocupantes, que garante o pagamento das indemnizações fixadas nas Condições Particulares, em consequência de acidente de viação de que sejam vítimas as pessoas transportadas, quando se desloquem, a título gratuito, no veículo seguro.
3. Conclusão
Face ao acima exposto, o contrato de seguro é um contrato de adesão e a liberdade contratual opera-se de forma diferente de outros negócios jurídicos: a Seguradora dita as regras e o tomador de seguro, querendo, adere-as, desde que, as mesmas não extravasem os ditames da Lei.
Assim sendo, salvo melhor análise pode-se partir do princípio que nada obsta que o Seguro de Responsabilidade Civil Automóvel possa excluir os danos e/ou lesões sofridos pelo passageiro transportado gratuitamente, podendo o mesmo risco, quando contratado, ser uma garantia adicional ao Seguro Automóvel – o Seguro de ocupantes.
É uma opinião.